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COVID-19 pode ser considerada doença ocupacional: veja como funciona

Aracaju - 06/07/2020
Por: Léa Andrade

 

Em 29/04/2020, o STF proferiu decisão liminar em que suspendeu a eficácia do artigo 29 da Medida Provisória nº 927, de 22 de março de 2020, expedida pelo Governo Federal objetivando minimizar os efeitos da crise pandêmica do Covid-19 sobre a economia, incluindo a mitigação do desemprego com a manutenção das relações de trabalho através de medidas de apoio aos empregadores e empregados.


O referido artigo trazia em seu texto: “os casos de contaminação pelo coronavírus (covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação de nexo causal”.


Pois bem, muito se noticiou que o STF reconheceu, com a decisão, que a doença originada pelo coronavírus tinha sido reconhecida como ocupacional como conclusão, lógica, do cancelamento da eficácia de tal dispositivo. No entanto, nem a decisão do STF declara explicitamente isso, nem a MP excluía tal hipótese.

 

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Foto: AirFocus/Unsplash


O art. 29 da MP 927/2020 trazia a ressalva de que o nexo causal seria sempre observado nos casos de configuração da Covid-19 como ocupacional, o que a prática demonstra ser tal assertiva já recorrente nas discussões judiciais sobre o tema que relaciona doença com ambiente laboral. Já a decisão do STF, ao determinar o cancelamento do artigo, acaba por deixar a cargo da legislação usual a análise de cada caso, como já ocorre nos processos em trâmite nos tribunais federais, sempre norteados pela instrução probatória para prova do nexo de causalidade.

 

E mais, a doença ocupacional é prevista na legislação previdenciária, cujo enquadramento decorre da existência de nexo causal presumido ou não. Em se tratando de doença endêmica, como é o caso do covid-19, o parágrafo 1º, alínea “d” do art. 20 da Lei nº 8.213/91 já faz previsão de que deverá haver comprovação do nexo de causalidade para comprovação da doença ocupacional:

 

“Art. 20. Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas: (...)
§ 1º Não são consideradas como doença do trabalho: (...)
d) a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho”.

 

Tem-se, assim, que o fato do art. 29 da MP ter sido cancelado não nos faz concluir que a covid-19 seja, necessariamente, doença ocupacional, devendo haver a comprovação do nexo causal, pelo que os empregadores devem adotar medidas preventivas determinadas pelos órgãos de saúde no intuito de proteger o trabalhador e evitar que tal nexo se estabeleça.

 

Neste cenário, quando se fala de profissional de saúde que está atuando em contato direto com pacientes infectados, tem-se que o nexo causal é presumido, conclusão referenciada na decisão da Corte Suprema. Já outros profissionais que não mantenham contato direto com situações de contágio, não se pode presumir tal relação.

 

Como nem os cientistas conseguem determinar como e quando a pessoa foi infectada, o exato momento de transmissão, difícil a comprovação do nexo causal pelo empregado, tendo o Supremo Tribunal Federal entendido que o ônus da prova recai sobre o empregador.

 

Nessa linha, os empregadores devem cumprir todas as medidas de segurança e prevenção determinados pelos órgãos de saúde, demonstrando, em caso de questionamento administrativo ou judicial, que adotaram medidas para preservar a saúde do trabalhador, como identificação de riscos, trabalho em home office, escalas laborais, rodízio de profissionais, distanciamento dentro do ambiente de trabalho, redução de jornada, orientação, treinamento e fiscalização sobre adoção de medidas relacionadas à saúde e higiene, entrega de equipamentos de proteção individual, disponibilização de máscaras, utilização de álcool em gel, dentre outros.

 

Enfim, adotadas todas as medidas, a análise quanto à configuração do covid-19 como doença ocupacional merece cautela antes de se caracterizar a responsabilidade do empregador, excetuando-se as situações em que restar, flagrantemente, presumida. 

 

Dessa forma, para que se evitem confusões quanto à extensão do efeito do cancelamento do art. 29 da MP 927/2020 e ainda maiores prejuízos para empregados e empregadores, certamente deve-se observar atentamente as legislações pertinentes ao tema, o caso em si e a boa prática jurídica.



Léa Andrade
Sócia do RR Advocacia, especializada em Direito do Trabalho há 20 anos, graduada pela Universidade Tiradentes no ano de 1999: lea@rradvocacia.com.br



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